A relação entre a indústria de jornais e a empresa Google ainda está cheia de espaços em branco , mas uma coisa parece certa: mais cedo ou mais tarde, a duas partes chegarão a um acordo. E a razão é simples: a empresa que criou o mais popular sistema de buscas na Web precisa dos jornais para ter acesso aos arquivos da imprensa e os jornais precisam da Google para chegar aos leitores.
Para a Google, este “namoro” não é essencial para sua sobrevivência, mas para os jornais, em quase todo o mundo, trata-se de uma questão crucial. A relação começou tensa quando a Associação Mundial de Jornais ( WAN) acusou a Google de “piratear” noticias por meio do Google News, um sistema automático de produção de noticias de atualidade. Mas agora dá sinais de uma acomodação e muitos acreditam que vai acabar numa negociação.
Esta relação é um fato novo na comunicação mundial e inexistia até a consolidação de internet como grande plataforma de comunicação. A situação mudou completamente depois da virada do século quando a rede entrou definitivamente e para valer no nosso quotidiano. O modelo de negócios dos jornais baseava-se na associação entre notícia e publicidade. A Web rompeu esta combinação ao oferecer conteúdos sem publicidade e ainda por cima grátis, no segmento da informação dura, de atualidade.
Os jornais resistem a aceitar esta realidade, o que acaba facilitando a estratégia da Google para ocupar um espaço na imprensa digital, a partir de três pontos básicos: distribuição, fidelização e monetização. A empresa nunca formulou estes três pontos de forma oficial, mas eles aparecem no texto How to Save the News, de James Fallows, da revista Atlantic, um jornalista com muitos contatos na direção da Google.
Fallows não detalha o que a Google classifica apenas como “o novo modelo de negócios da imprensa” na era digital. Mas alguns indícios surgem espalhados pelo artigo publicado na edição de junho da revista, cujos leitores são, majoritariamente, intelectuais da costa leste dos Estados Unidos.
A Google, aparentemente, descartaria o papel como veículo para distribuição de notícias por conta do fator custo. Toda a informação jornalística seria transmitidas pela internet, ficando o papel restrito a documentos e textos longos.
Conseqüência imediata, os parques gráficos ficariam ociosos e teriam que encontrar outra utilidade. Os jornais que ainda estão pagando empréstimos feitos para comprar rotativas, terão um grande prejuízo e é por isto que eles tentam ganhar tempo a qualquer custo. O papel continuará sendo um suporte para a informação, mas os jornais já não serão mais um de seus usuários mais constantes.
Na fidelização, a idéia da Google, “psicografada” por James Fallows, é a de que o noticiário deve ser desmembrado para que o leitor tenha acesso mais fácil ao que deseja. No jornal impresso, o leitor compra um exemplar inteiro para ler apenas a seção de esportes ou de classificados. Paga por conteúdos que ele raramente lê.
Na Web, o leitor pode ir direto ao seu assunto preferido, passando ao largo até mesmo da publicidade. Mais do que isto, em vez de ir até a notícia, é esta que vem até ele por meio de sistemas eletrônicos como o RSS. Com tantas facilidades, a briga pela fidelização fica desigual.
A monetização, ou seja, transformar notícia em dinheiro, é o grande dilema de executivos da Google, como Krishna Bharat, encarregados de fechar a parceria com a indústria de jornais. É aqui que a porca torce o rabo, porque os próprios cérebros da Google admitem que não têm uma solução pronta, mesmo depois do tremendo sucesso obtido com os programas Adwords e Adsense, voltados para a coleta de publicidade online em nichos econômicos.
A questão é a seguinte: produzir notícias custa dinheiro e dependendo do tipo de noticia, pode sair bem caro, como é o caso de reportagens investigativas ou projetos informativos em formato multimídia. A notícia dura, tipo acabou de acontecer, sai bem mais em conta porque os leitores podem colaborar, baixando os cursos.
Neste caso, o modelo Google poderia ser adaptado para a imprensa, porque permitira um faturamento pingado, ou seja, pequenos valores em fluxo contínuo, cobrindo custos reduzidos. Este segmento seguramente não atrairá a atenção dos jornais porque eles, provavelmente, se concentrarão no “atacado” jornalístico, deixando os blogs, portais de atualidades comunitárias e páginas especializadas para o chamado “varejo” informativo, produzido por autônomos, amadores e profissionais.
Para financiar as grandes investigações e projetos de largo prazo, os recursos teriam que vir de outras fontes. Eric Schmidt, CEO da Google, está convencido de que as pessoas acabarão pagando pelo acesso à informação qualificada, mas isto é por enquanto apenas um desejo, ou o que os norte-americanos chamam de wishful thinking.
Especula-se que a Google poderia ser um grande financiador do “atacado” jornalístico em troca da permissão para digitalizar os arquivos dos grandes jornais. A negociação parece estar se concentrando neste ponto. Em 2008, a Google começou a digitalizar parte dos arquivos de grandes jornais norte-americanos mas o processo não foi completado. Os jornais, com exceção do The New York Times, ainda não digitalizaram integralmente os seus arquivos por falta de dinheiro. Para a Google, esta digitalização teria custos marginais porque a empresa já está fazendo o mesmo com livros e mapas.
O “namoro” Google/jornais não interessa apenas às partes diretamente envolvidas. Ele afeta, e muito, a nós leitores e jornalistas porque é o nosso futuro informativo que está sendo negociado. Ainda estamos longe de uma democracia noticiosa, mas pelo menos com a Web, o público tem mais canais de expressão de sua vontade que na era do papel.
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